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Cabeleireira fica cega de um olho e acusa médica


24/09/2014
Jornal A Tribuna   |   Lorrany Martins

A cabeleireira e manicure Kelly Fernanda do Nascimento, 27 anos, perdeu a visão do olho esquerdo por causa de uma inflamação que demorou a ser tratada.

Ela acusa uma médica cubana que atende na Unidade de Saúde de Serra Dourada II, na Serra, de ter errado o diagnóstico e, por isso, está processando a Prefeitura da Serra.

“Estava fazendo o pré-natal com a médica e no quarto mês de gravidez, no dia 6 de março, tinha uma consulta marcada com ela. Nesse dia, acordei com o olho vermelho e doendo e aproveitei que teria uma consulta com ela.”

Kely disse que foi recebida pela médica, que perguntou se estava tudo bem. Logo, a cabeleireira relatou que estava com o olho vermelho.

“Sem nem ao menos olhar direito, ela disse que eu estava com conjuntivite e continuou fazendo as coisas do pré-natal. No final da consulta, ela me passou as orientações do pré-natal e estava se despedindo quando falei: 'E meu olho, doutora?'”

A cabeleireira contou que a médica passou dois colírios e disse para fazer compressa de água no olho. “Passei os remédios durante 15 dias e parecia que estava piorando. Comecei a ver tudo embaçado e continuava doendo muito.”

Depois disso, ela contou que pro curou o Hospital Jayme Santos Neves, na Serra, para ver se conseguia atendimento. “Já não estava mais aguentando de dor e meu marido me levou até o hospital. Eles não queriam me atender, mas comecei a reclamar que estava grávida e uma médica resolveu me atender. Ela disse que eu estava com uveíte (inflamação no olho) e perdendo a visão.”

Quase dois meses depois de ter recebido o diagnóstico de conjuntivite, a cabeleireira voltou para se consultar com a médica cubana para o pré-natal.

“Ela me perguntou se estava tudo bem ainda. Quando disse que não e que estava perdendo a visão, ela ficou surpresa e me deu um encaminhamento para o oftalmologista, mas já era tarde.”

De acordo com o advogado de Kely, Luiz Mouzi, a cabeleireira entrou com um processo contra a prefeitura e está pedindo indenização por danos morais e estéticos. “Ela é uma jovem ainda, mãe de duas meninas. E só quem perdeu a visão, uma perna, ou alguma coisa assim, que sente a dor. Então, temos que cobrar responsabilidade”.

“Não consigo trabalhar”


Quando estava à espera de seu segundo filho, a cabeleireira Kely Fernanda do Nascimento, 27, não imaginava que a vida fosse mudar tanto depois de acordar com o olho esquer do vermelho e ardendo.

Hoje, depois de perder a visão do olho esquerdo, ela está tentando se adaptar, mas lamenta não conseguir mais atuar em sua profissão.

A TRIBUNA -
Como está a vida hoje, depois de perder a visão?

KELY DO NASCIMENTO - Estou tentando me adaptar ao que aconteceu. Mas não consigo trabalhar mais. Quem vai querer fazer a unha, cortar o cabelo ou fazer uma escova com uma cabeleireira cega?

Eu sei que tem gente que se adapta a esse tipo de situação, mas eu vou ter de fazer outra coisa. Mas, agora, tenho um bebê, uma filha de 8 anos e um marido para poder cuidar. Não sei mesmo o que fazer.

>Você voltou a encontrar a médica cubana depois de descobrir que o problema na visão era uveíte?

Voltei. Estava fazendo pré-natal com ela. A médica ainda bateu nas minhas costas e perguntou se tinha melhorado da conjuntivite. Fiquei brava com ela e disse que estava perdendo a visão e que não era conjuntivite e sim uveíte (inflamação no olho). Ela fez cara de assustada e perguntou o que era uveíte.

Ironicamente, respondi para ela que, se descobrisse, era para me avisar. Depois disso, ela me encaminhou para o pré-natal de alto risco, consulta com o oftalmologista e infectologista.

>E você não vai voltar a enxergar ?

Os médicos disseram que o tratamento tinha de ter sido feito corretamente no começo. E que, com o tempo, eu fui perdendo a visão e agora não há como recuperar. Estou cega e vou ter de me adaptar a isso.

Eu sei que o processo contra a prefeitura vai demorar, mas pelo menos vai ter justiça, porque isso não pode ficar desse jeito.

>Já teve outros problemas com essa médica do posto?

Enquanto ela estava fazendo o meu pré-natal, não tinha nenhuma reclamação contra ela. É uma médica com quatro qualificações, mas nenhuma delas com especialidade para olhos.

Há uma senhora que está no hospital em estado grave, estão dizendo que foi diagnóstico errado, mas comigo essa foi a primeira vez. Mas fez um estrago para minha vida toda.

Equipe do Ministério da Saúde vai visitar o posto


Após a denúncia da cabeleireira Kely Fernanda do Nascimento, 27, que perdeu a visão do olho esquerdo e acusa uma médica cubana de errar o diagnóstico, a Unidade de Saúde de Serra Dourada II, na Serra, vai receber a visita de uma equipe do Ministério da Saúde.

A visita será para investigar a denúncia contra a profissional do programa Mais Médicos, do Ministério da Saúde em parceria com a Prefeitura da Serra.

Em nota, o Ministério da Saúde informou que a unidade onde a médica atende vai receber uma visita técnica do supervisor do programa Mais Médicos.

“A coordenação nacional do programa aguarda o relatório de supervisão que vai avaliar a conduta do médico. Neste período, o profissional tem assegurado o direito de resposta e ampla defesa". informou, em nota.

A solicitação para a visita do representante já foi enviada pela coordenação estadual do Mais Médicos, mas ainda não há data prevista para essa visita.

A nota do Ministério da Saúde explicou ainda que, em caso de suspeita de erro de procedimento, de diagnóstico, de encaminhamento e de receituário envolvendo profissionais do Mais Médicos, a coordenação nacional faz contato com o gestor municipal e com a referência estadual do programa para apurar o caso.

De acordo com secretário de Saúde da Serra, Luiz Carlos Reblin, a prefeitura está apurando as informações do caso de acordo com os prontuários de atendimento de Kely.

“Estamos investigando o que acontece, mas até o momento tem apenas dois registros da paciente na unidade de Serra Dourada II. Em um, a médica do Mais Médicos pediu um exame de gravidez e em outro ela relata a outra médica a dor no olho e diz que, há 15 anos, teve cloro em contato com o olho”, explicou o secretário.

Segundo o governo federal, denúncias sobre condutas inadequadas dos médicos participantes do programa Mais Médicos devem ser feitas para a coordenação estadual do programa, para a ouvidoria do SUS, por meio do número 136, ou enviadas para o endereço de e-mail maismedicos@saude.gov.br.

COMO DENUNCIAR


Telefone ou e-mail

> DENÚNCIAS SOBRE condutas inadequadas dos médicos participantes do programa Mais Médicos devem ser feitas para a coordenação estadual do programa ou ao Conselho Regional de Medicina (CRM-ES).

> AS DENÚNCIAS PODEM ser regista das na ouvidoria do SUS, por meio do número 136, ou enviadas para o endereço de e-mail maismedicos@saude.gov.br.

Médicos explicam sintomas


A uveíte, doença que deixou a cabeleireira Kely Fernanda do Nascimento, 27, cega do olho esquerdo, é uma inflamação na parte interna do olho. Os primeiros sintomas são ardência, visão embaçada e os olhos vermelhos.

De acordo com oftalmologistas, são sintomas semelhantes aos da conjuntivite e, a olho nu, os diagnósticos podem ser confundidos.

“Por isso, mesmo com a suspeita de uma simples conjuntivite, é preciso encaminhar para o oftalmologista para que ele, com os aparelhos, faça os exames para identificar onde está a inflamação”, explicou o oftalmologista Cesar Barbieri.

De acordo com o oftalmologista Ubirajara Moulin, há várias causas para a inflamação, mas na maioria dos casos ela está relacionada à toxoplasmose.

“O protozoário da toxoplasmose tem predileção por olhos. Os principais meios de contaminação pelo protozoário são carnes cruas e verduras mal lavadas”, ressaltou.

Segundo Moulin, as sequelas da doença podem chegar a deixar o paciente cego, como aconteceu com a cabeleireira, mas isso pode ser evitado se o diagnóstico for rápido e eficaz.

“O tratamento é um pouco chato e demorado, pode levar de 40 a 45 dias e com visitas semanais ao oftalmologista. Mas, ao final, a visão pode ser recuperada, se não atingir a parte central do olho.”

Visão turva e dor no corpo


O que é uveíte?

> É UMA INFLAMAÇÃO na parte interna do olho, chamada úvea. Ela pode inflamar parcial ou totalmente.

Sintomas

> OS PRIMEIROS SINTOMAS podem ser sutis e confundidos com os da conjuntivite. São eles: olho vermelho, sensibilidade à luz, dor no corpo, visão turva e embaçada.

Causas

> A UVEÍTE TEM MUITAS causas possíveis. Segundo médicos, no Estado a causa mais comum é a toxoplasmose, doença infecciosa, congênita ou adquirida, causada pelo protozoário toxoplasma gondii, encontrado nas fezes dos gatos, verduras e legumes mal lavados.

O QUE ELES DIZEM


"A uveíte pode se confundir com conjuntivite, no quadro inicial. Há casos que são intensos." Ângelo Passos, oftalmologista

"Para evitar a uveíte é preciso ter cuidado com a toxoplasmose, que é a principal causa." Cesar Barbieri, oftalmologista