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UTI Infantil fechada há um ano no HUCAM
23/02/2018 - 19:04

Berços e leitos pediátricos se enfileiram, ao lado de equipamentos de monitoramento e de suporte de vida. Tudo novo, num ambiente reformado, que nunca foi usado. É a realidade da UTI Pediátrica do Hospital Universitário Cassiano Antônio Moraes (Hucam), conhecido como Hospital das Clínicas, em Vitória, com 16 leitos, sendo 10 intensivos e seis semi-intensivos, que aguardam há quase um ano pela inauguração. Lá só faltam profissionais para o atendimento de médicos a técnicos de laboratório.

O mesmo não se pode dizer dos pacientes e sua demanda pelos raros leitos públicos de pediatria no Estado, como relata Norma Suely Oliveira. Além de professora do Departamento de Pediatria da Ufes e chefe da Unidade de Terapia Intensiva, Semi-intensiva e Pediátrica, ela ainda responde pela UTI Neonatal, destinada a recém-nascidos. "Já ficamos na UTI Neonatal com um bebê por ano e cinco meses, com problemas pulmonares, por falta de leito em outras unidades", relata.

Escassez
O fato acontece na Grande Vitória, que conta com mais 28 leitos pediátricos em dois outros hospitais da rede estadual, em Vitória e Vila Velha e pretende abrir outros 11. Mas a escassez deste tipo de leito que faz com que a Secretaria de Estado da Saúde (Sesa), em situações de emergência, tenha que comprar espaços em hospitais filantrópicos ou privados.

No ano passado, a Central de Regulação de Vagas da Sesa, para onde vão as demandas por leitos, recebeu 109 solicitações, vindas de todo o Estado. Mas não informou quantos foram comprados. Segundo Norma, 16 leitos da UTI Pediátrica seriam regulados pela mesma Central, o que ajudaria nas demandas.

O projeto da UTI custou R$ 2,6 milhões, entre a reforma do prédio e a compra dos equipamentos. Levou quase três anos para ser concluído e a expectativa era de que começasse a funcionar em julho do ano passado. "Mas fomos surpreendidos com a não-realização de concursos para médicos e outros profissionais. Sem eles, não temos como colocar a unidade para funcionar", explica Norma.

Uma situação que nem mesmo a vinda do ministro da Saúde, Ricardo Barros, em novembro do ano passado para inaugurar a conclusão das obras, foi capaz de mudar. Agora, a expectativa é para janeiro de 2019. Isto, como relata Norma, se for autorizada a realização de concurso para o primeiro semestre deste ano.

Disponível
Na área de tratamento intensivo já estão disponíveis quatro leitos neonatais e seis pediátricos, sendo um deles em ambiente totalmente isolado, seguindo o que preconiza a Anvisa. São destinados a pacientes com doenças infecciosas ou imunodeprimidos. "É o mais moderno que existe, com filtro especial", relata a médica.

Há ainda seis leitos semi-intensivos. No local, poderão ser atendidas crianças a partir de 29 dias a adolescentes com menos de 15 anos. O Hucam é referência no tratamento pediátrico de reumatologia, nefrologia, endócrino e recém nascido de alto risco, vindos até de outros hospitais.

Para colocar a UTI Pediátrica do Hucam em funcionamento, vão ser necessários, no mínimo, 86 profissionais. De acordo com Norma Suely Oliveira, chefe da Unidade de Terapia Intensiva, Semi-Intensiva, Pediátrica e Neonatal (UTISIpedneo), só de médicos intensivistas vão ser necessários 14.

Deste total, o hospital conta hoje com oito. Segundo Norma, como acreditava-se que o concurso seria liberado, foram chamados os médicos que estavam na reserva do último concurso, oito profissionais que atuam hoje na UTI Neonatal.

Com o reforço deles, ela conseguiu ampliar o número de leitos da Neonatal de 10 para 25. Lá atuam além dos oito médicos convocados outros três enfermeiros na mesma condição. "Nossa expectativa era de que fosse realizado outro concurso e pudéssemos convocar os profissionais que faltavam, o que não ocorreu", conta Norma.

Além dos médicos, para funcionar a UTI Pediátrica demandaria ainda enfermeiros (16), técnicos de enfermagem (46) e fisioterapeutas (10). E precisaria do apoio de especialistas que compartilhariam sua atuação com outros setores do hospitais, como nutricionistas, técnicos de laboratório, lactário, farmacêutico, assistente social, psicólogo e terapeuta ocupacional.

Outro Lado
Uma solução mais rápida para o problema viria de um apoio da Secretaria de Estado da Saúde (Sesa) e até da Prefeitura de Vitória, como pondera o superintendente do Hucam, Luiz Alberto Sobral Vieira Junior. "Vamos tentar conversar com todos novamente. Poderíamos tentar uma ajuda temporária, até ser possível viabilizar o concurso", ponderou.

De acordo com a Empresa Brasileira de Serviços Hospitalares (Ebserh), responsável pelos hospitais universitários, com a estrutura física já entregue, agora os esforços estão concentrados "em finalizar o dimensionamento dos serviços e de pessoal e em viabilizar formas de contratação dos profissionais para a unidade". Mas não informa prazos. A Sesa informa que, quando houver a abertura da UTI Pediátrica, poderá analisar a contratação do serviço.

ANÁLISE - "Estratégia de desmonte do SUS"

Dificilmente a contratação de servidores para esta UTI pediátrica deverá sair. E não se trata apenas de problemas de burocracia, que existe, e de gestão. Mas é uma decisão política do governo federal, cujo projeto para a Saúde é o de transferir recursos para a iniciativa privada. Não há interesse em contratar pessoas via concurso público, de forma igualitária, como previsto na Constituição. Isto não acontecerá com facilidade. Acham mais fácil comprar leitos. E estamos falando de leitos raros, destinados a crianças que não estão tendo acesso à saúde. Um recurso já investido, com a reforma e compra de equipamentos, que vai envelhecer. Então, não é só um problema de gestão e de burocracia, mas de estratégia política, de desmonte do SUS. - ELDA BUSSINBER, Doutora em Bioética, Mestre em Direito e Professora da FDV

REDUÇÃO NO NÚMERO DE LEITOS ADULTOS

As dificuldades com pessoal também afetaram a UTI de adultos do Hucam, que teve seu número de leitos reduzido de 16 leitos para dez, por falta de médicos, como relata o superintendente do hospital, Luiz Alberto Sobral Vieira Junior. Ele relata que a situação foi motivada, principalmente, pelo fato de que alguns médicos que atuavam na UTI de adultos tiveram que lançar mão de afastamento legais. É que as mudanças na legislação trabalhista determinam que mulheres que atuem neste tipo de ambiente precisam ser afastadas durante o período de gestação, além da licença maternidade.

Como não podiam contratar novos médicos, o superintendente optou por transferi-las para o Pronto-Socorro. "Em função disso, precisamos reduzir o número de leitos na UTI", explicou.

Por outro lado, acrescenta Sobral, as mudanças permitiram que fosse feito um reforço no atendimento do Pronto-socorro. "Conseguimos assim valorizar a nossa porta de entrada, melhorando o atendimento de complexidade para os pacientes cardiovasculares", relatou.

A expectativa dele é de que uma solução para o problema possa vir até julho deste ano. Ele se refere à possibilidade de contratação temporária, via concurso público, que deve ser liberada nos próximos meses.

No caso das duas UTIs, - pediátrica e adulto - o problema decorreu de um dimensionamento de profissionais feitos para o hospital em 2013, pelo Ministério do Planejamento. Ele não contemplou, segundo Sobral, as demandas que foram surgindo nos anos seguintes, como a criação de uma UTI Pediátrica. Isto sem contar os afastamentos legais, como os casos de gravidez e por doenças ou até trabalhista.